30 de abril de 2011

Homenagem: 22 anos sem Sergio Leone

ERA UMA VEZ... NO CINEMA EXPLOSIVO DE SERGIO LEONE

Um belo tributo do blog “Analisando o Oeste”, em homenagem a uma das maiores lendas que a sétima arte já viu, falecida há exatos 22 anos.

Em meio a homens de barba malfeita, tiros e explosões para todos os lados, paisagens e músicas de tirar o fôlego, momentos silenciosos que demonstravam tensão máxima, sacadas inteligentes e diálogos irônicos, Sergio Leone construiu seu próprio cinema, transformando-se em uma das maiores lendas de algo conhecido como “sétima arte”. Atualmente é tido como um dos maiores cineastas da história de seu país (Itália), justamente ao lado de outros grandes mestres macarrônicos, como Vittorio De Sica e Rossellini. Nesta postagem será feita uma homenagem a um dos maiores inspiradores do cinema contemporâneo, abrangendo sua vida e suas características cinematográficas. Então, apenas lhes dou uma dica: aproveitem ao máximo, bem como se deve apreciar um mestre como foi Sergio Leone.

Italiano por completo, Sergio Leone nasceu em Roma, no dia 3 de janeiro do ano de 1929; filho de pai já relacionado ao cinema, sua relação com as telonas começava desde cedo: com apenas 18 anos, era assistente de grandes diretores, como De Sica, Comencini e Mervyn LeRoy. No filme “Ladrões de Bicicleta” (1948), dirigido por Vittorio De Sica, Leone tem uma pequena participação como um estudante de seminário.

Sergio Leone (primeiro à esquerda) participando de “Ladrões de Bicicleta”.

Antes de realizar a película que mudaria sua vida – e também a do cinema –, Sergio Leone mantinha contato com os chamados filmes pepluns, ambientados na Antiguidade, principalmente greco-romana. Foi nesta atmosfera que o diretor conseguiu cumprir seu primeiro trabalho na direção, em 1961, com o filme “O Colosso de Rodes”. Três anos depois realizou o antológico e polêmico “Por um punhado de dólares”, criando um novo gênero cinematográfico, o qual seria responsável por consagrar o trabalho de Leone pelo resto de sua vida: o western spaghetti. Este nome é o resultado de uma mistura entre a palavra estadunidense que define o gênero faroeste (western) unido com uma tradicional comida italiana (o spaghetti), devido às películas serem realizadas por um italiano de origem . Essas produções eram até mesmo consideradas “baratas”, já que eram feitas de uma forma simples: locações na Europa (Itália e Espanha, principalmente), porém com cenários baseados no velho-oeste americano; artistas de diversos países; repetição de atores em todos os filmes da trilogia, etc... Como já citado acima, o filme acarretou uma polêmica: foi considerado como um remake de “Yojimbo” (1960), diferenciando-se do filme japonês apenas por ser ambientado no faroeste. Inclusive, Akira Kurosawa (diretor de Yojimbo) insistiu em receber um punhado de dólares do diretor italiano e faturou mais de cem mil dólares pelo processo contra Sergio Leone.

Após “Por um punhado de dólares”, Sergio Leone se destacava cada vez mais e acabou por realizar mais dois filmes (estes sem ideias “roubadas”), culminando na criação da famosa “trilogia dos dólares”. Nesta trilogia, merecem grandes destaques: a trilha sonora que revolucionou o cinema, composta pelo maestro Ennio Morricone, vivendo até hoje nas mentes de verdadeiros cinéfilos; criação de suas próprias regras cinematográficas, inovando e desafiando o cinema estadunidense; invenção de personagens únicos, com ênfase para “o homem sem-nome”; descoberta de atores que antes não possuíam nenhum destaque e que mais tarde se tornariam grandes ícones do mundo cinematográfico, como Clint Eastwood. Aliás, Sergio Leone até soltou uma frase a respeito de Eastwood: “Eu gosto do Clint Eastwood porque ele tem somente duas expressões faciais. Uma com o chapéu e outra sem ele”.

Sergio Leone e Clint Eastwood durante as gravações do primeiro filme da “trilogia dos dólares”, responsável por alavancar o western spaghetti.

Logo após a realização da “trilogia dos dólares”, Sergio Leone decidiu se aventurar em mais uma trilogia, desta vez chamada de “trilogia da América”, possuindo filmes esteticamente perfeitos, principalmente quando falamos a respeito de sua maior obra-prima, segundo muitos cinéfilos: “Era uma vez no Oeste” (1968). Foi a partir desta película que os trabalhos de Leone pararam de ser considerados de “baixo orçamento”, já que trazia um elenco de primeira, estrelando atores como Charles Bronson, Henry Fonda, Jason Robards e Claudia Cardinale. Com esta grande produção, Leone mostra um “cinema de tirar o fôlego” e, sem se limitar a um bom elenco, também marcava seu território com músicas da mais alta patente do western spaghetti, coordenadas por Ennio Morricone; cenários no maior estilo John Ford; personagens claramente definidos (o vilão nos olhos azuis de Fonda, o vingativo na atuação de Bronson, a mocinha indefesa na beleza de Cardinale). Além de todos estes “meros detalhes”, Leone ainda busca mostrar “o fim do velho-oeste” de forma sofisticada, apresentando a aplicação de ferrovias e as novas tecnologias da época, mas tudo isso com suas próprias características.

E, falando em características, isto é algo que não falta para falar a respeito de Sergio Leone: criou seu próprio estilo fílmico, algo totalmente particular do diretor. Dentre suas mais conhecidas características estão: close-ups extremos, momentos silenciosos e tensos, diálogos irônicos, efeitos sonoros incríveis, perfeita sincronização entre imagem e som, intensas explosões, violência estilizada, flashbacks que criavam novas histórias, cenas repletas de pessoas nas ruas, duelos em todos finais de filmes, entre outras especialidades. Com essas peculiaridades, o diretor italiano desafiava o cinema estadunidense, o grande centro cinematográfico: a sétima arte norte-americana utilizava de 8 a 12 frases por minuto, enquanto os filmes de Leone traziam incríveis 3 a 7 frases; no western spaghetti, era permitido que se filmasse o tiro e a vítima sendo atingida (sem cortes), o que era proibido em Hollywood; os personagens de Sergio Leone, com barba malfeita e roupas sujas substituíram os heróis norte-americanos, de camisas arrumadinhas e até parecendo “cheirosos”, sugerindo ídolos da música country.

A grande diferença entre os heróis de Sergio Leone e os heróis norte-americanos.

Depois da realização de “Era uma vez no Oeste”, Sergio Leone realmente havia se consolidado na história do cinema, porém, como se não bastasse, o diretor ainda dirigiu mais um western, o qual mais tarde entraria para sua última trilogia da carreira: “Quando Explode a Vingança” ou “Era uma vez... A Revolução” (1971). O segundo título é o mais adequado, já que se aplica melhor à filosofia do filme, ambientado na época da “Revolução Mexicana”, através dos olhos olhos de um revolucionário irlandês (James Coburn), juntamente com um mexicano sujo (Rod Steiger). Todos dizem que foi “o trabalho mais politizado de Sergio Leone”, porém que é imprescindível não dispensarmos as peculiaridades vitais do diretor italiano.

Durante anos sem realizar filmes, Leone caiu na tentação de desejar boas críticas, o que não vinha acontecendo, já que seus filmes eram considerados “parados e um tanto quanto violentos” para a época. Entre 1971 e 1984, Sergio Leone simplesmente dividiu alguns trabalhos, como os de “Meu nome é ninguém” (1973) e de “Trinity e seus companheiros” (1975), respectivamente com Tonino Valerii e Damiano Damiani. Porém Sergio Leone não estava simplesmente parado. Apesar de produzir algumas coisas, ele andava desenvolvendo seu maior clássico, um dos melhores filmes de máfia depois de “O Poderoso Chefão” (1972): “Era uma vez na América” foi preparado durante 13 anos e essa longa espera não valeu muito para os críticos, que mais uma vez “pisaram em cima de Leone”, criticando duramente o filme de quase 4 horas, justamente por sua “longa duração, extrema violência, cenas de sexo, etc...”. Eram 229 minutos de pura estranheza por parte da plateia porém por trás de tudo havia grandes lances da genialidade “leônica”. Inclusive, este foi o único filme de Sergio Leone indicado para algum prêmio cinematográfico, vencendo apenas alguns deles .

Cena inicial de “Era uma vez no Oeste”, uma das mais emblemáticas da vida cinematográfica de Sergio Leone, demonstrando a imensa genialidade e preocupação que o diretor tinha com a parte sonora de suas películas.

Infelizmente, a vida precisa ser assim: trabalhos de diretores como Sergio Leone passam a ser reconhecidos somente depois de muito tempo. Apesar de atualmente causar a influência em artistas como Quentin Tarantino e Robert Rodriguez, Sergio Leone era alguém sem extrema importância na época. Realizava obras-primas e tudo mais que fosse necessário para o cinema, porém não possuía o reconhecimento que têm hoje. Além de inspirar tais artistas, Leone ainda empolgou com sua magia os diretores da nova era decorrente do cinema, chamada de “New Hollywood”, como Brian De Palma, Sam Peckinpah, Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, etc... E, de um jeito ou de outro, ele criou um novo estilo cinematográfico... Um estilo completamente SEU, o que hoje ainda é responsável por destacá-lo. Ou seja, tudo demonstra que o cinema de Sergio Leone valia muito mais que “um punhado de dólares”. E ainda mais, algo que desejo destacar mais do que tudo: Sergio Leone não realizou apenas faroestes, como muitos pensam... Praticou o cinema por completo dentro de um único gênero. Isto é, tudo de mais magistral possível encontrado no cinema, poderíamos encontrar nos westerns de Sergio Leone.

Falecido há exatos 22 anos, no dia 30 de abril de 1989, Sergio Leone marcou uma nova era para a sétima arte. Fez tudo que lhe era possível, tudo que tinha ao seu alcance ele realizou: criou, roubou, criticou, revelou, marcou, inspirou e, por incrível que pareça, Sergio Leone ainda continua fazendo isso. Nas mentes de diferentes gerações – de jovens como eu, de adultos como Tarantino e até de “velhos” como Eastwood – Sergio Leone continua sendo o verdadeiro mestre para nós... E continuará sendo, até que o cinema nos separe!

“Se inclui tantos close-ups extremos em meus faroestes, em grande medida é porque quero mostrar que os olhos são o elemento mais importante. Tudo pode ser lido nos olhos: coragem, ameaça, medo, incerteza, morte” – Sergio Leone explicando o “porquê” da utilização de sua maior característica.

Parte do documentário “Era uma vez… Sergio Leone”, contando com a participação de famosos cineastas que trabalharam ou são influenciados pelo mestre italiano, falando sobre ele.

No Brasil, o gênero é conhecido como “bang-bang à italiana”.

As filhas de Sergio Leone – Andrea e Raffaella – acrescentaram, recentemente, mais de 40 minutos exclusivos para a película, um verdadeiro presente para os fãs do diretor.

Foi indicado para o Globo de Ouro de “Melhor Direção” e “Melhor Trilha Sonora”, perdendo os dois prêmios; foi vencedor no BAFTA (British Academy of Film and Television Arts) de “Melhor Trilha Sonora” e “Melhor Figurino”, sendo ainda indicado como “Melhor Atriz Coadjuvante” (Tuesday Weld), “Melhor Diretor” e “Melhor Fotografia”.

11 comentários:

  1. Sérgio Leone... simplesmente o "maior" diretor de cinema de todos os tempos! E nada mais.

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  2. Esse cara marcou o cinema pra sempre mesmo... Impossível falar da sétima arte sem se lembrar dos filmes nada menos que lendários desse monstro...

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    1. Sem dúvida, Anônimo! Assino embaixo...

      Sempre foi e, provavelmente, sempre será meu diretor predileto.

      Abraços. Volte sempre!

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  3. Kubrick era pra mim o melhor diretor de cinema, até eu conhecer os filmes de Sergio Leone.

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  4. Ninguém até hoje teve a capacidade,ou, felicidade, de entender a fórmula da capitação plena do sentimento, da emoção e da sensibilidade de um personagem ficticio, através das lentes de uma camera, ninguém além de Leone. Ele fez, ou melhor, faz, com imagens, sons e silêncio, aquilo que só é possível em livros e na vida real. Como amante da 7a. arte que sou me sinto privilegiado por ter acesso ao seu legado. Obrigado Leone! Viva Leone!

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  5. Renato Souza com esse comentário você me derrubou. Que eloquência, que paixão. Mas com leone é assim mesmo, a eloquência, a paixão e a fantasia pulsam em nossos corações como se fossem as imagens de seus filmes. Muitos quiseram (e até invejaram) e querem ter o talento extraordinário desse monstro como disse o anônimo. Existiram e existem grandes diretores de cinema , mas para mim Leone é único e superou todos, a meu ver, que vieram antes dele e influenciou definitivamente todos que vieram depois como Brian de Palma, Sam Peckinpah (que foi praticamente seu contemporâneo), Martin Scorsese e mais recentemente Quentin Tarantino. O cinema atual tem o seu rosto, o seu close. Endossando as palavras de Bruno, autor do texto, apesar de ter dirigido quase só faroestes ao longo de sua carreira,em seus filmes é possível encontrar citações e referências praticamente sobre tudo, além do próprio cinema em si,poesia, filosofia, pintura, iconografia religiosa,sub textos de teor político e filosófico, etc.Também digo Viva, viva, viva Leone.

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  6. Leone e Morricone colocaram o cinema no mais alto lugar que de fato ele merece. Seus filmes reuniram sensibilidade e inteligência nunca visto antes e inúmeras cenas chagaram ao maior grau de beleza a tal ponto de ficarem guardadas eternamente, não na memória mais na consciência.

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