6 de novembro de 2012

36ª Mostra Internacional de Cinema: Crítica | Rio de Ouro

 RÍO DE ORO
(RIO DE OURO)

Escrito e dirigido por: Pablo Aldrete
Elenco: Gonzalo Lebrija, Stephanie Sigman, Kenny Johnson...
Ano: 2010
Duração: 96 minutos

 As terras são, verdadeiramente, de quem as protege?

Análise: Em uma das pinturas mais conhecidas de Cândido Portinari, Os Retirantes, a representação que faz o pintor de um povo na caçada por melhores qualidades de vida é tão visceral que, caso não conhecêssemos a nua e crua realidade, dificilmente acreditaríamos que tal obra tentava presumi-la. Mesmo de difícil comparação, as semelhanças entre esse quadro brasileiro e o faroeste mexicano Rio de Ouro são muitas, partindo desde o primeiro plano do filme até as questões levantadas pelo mesmo, em um tema atemporal (logo, é atual) e polêmico como o desaparecimento de inúmeros indígenas – nós, tupiniquins, que o digamos do recente genocídio coletivo da tribo Guarani-Kaiowá. Talvez a única diferença entre os objetos de estudo acima seja, mesmo, o fato de os retirantes deixarem suas terras por vontade própria, devido a secas e derivados, ao contrário dos nativos, que são expulsos e, muitas vezes, exterminados sem deixar rastro de sua própria cultura, preocupação tomada pelas lentes do realizador Pablo Aldrete. 

“Deus, por que deixais que matem meu povo?”

Um tropeiro preza pela venda de seu rebanho e a jovem Estela só pensa em continuar a viver depois que sua família é morta por um índio que ensaia uma raivosa retomada das terras de sua tribo; enquanto isso, dois soldados norte-americanos exploram esta mesma região em busca de ouro. Apenas pela premissa em questão, encontros e desencontros já se fazem previsíveis desde o início, além da retomada do clássico tema envolvendo brancos e índios, mas, desta vez, com um tempero a mais: os mexicanos. 

Percorrendo as três camadas combatentes, nota-se um desenvolvimento pouco verossímil entre elas e, principalmente por ser uma produção do México, há certa desvalorização do país vizinho e eterno inimigo, os Estados Unidos. E, para clarear a visão sobre o frequente sumiço indígena, um valente paralelo é subentendido: comparam-se animais aos nativos, em cenas de tortura a ambos, nas quais são escalpelados. Não parando por aí, o roteiro desequilibra-se e passa a caminhar por linhas confusas quando idealiza os indígenas ora como seres oriundos da natureza e nada mais que isto, ora como homens sem escrúpulos (igual àqueles que lutavam contra), prendendo mulheres na aldeia pelo mero desejo de punição aos brancos; querendo ou não, é o que desacelera o ritmo quando mais se precisa de atenção. 

Focado na investida para compensar os erros da escrita, Aldrete faz de sua direção algo ousado e alegórico, com paralisações na imagem em lances inesperados, como no sangue espirrando por todo o ar. Apesar de tentar, cria situações desestimulantes, e o que mais incomoda são a gama de imagens aleatórias da natureza, aparentando falta de material para compor os fotogramas, fora os flashbacks nulos e duvidosos, comprometendo a fita também pelas atuações forçadas e frouxas, sem firmeza. 

Visualmente, a lente e o olhar do fotógrafo Lorenzo Hagerman alcançam o mais distante dos pontos no deserto mexicano e tentam dar mais vida à morte e sofrimento dos índios; como já se aguarda em um faroeste, faz sua parte em planos abertos, e, igualmente, naqueles que contém uma fina violência. 

 “Mexicanos, índios... Eles são o mesmo”

Moderno e polêmico, nada impede que o assunto de Rio de Ouro se afogue e vaze por água abaixo, perdendo-se nas profundezas midiáticas; foi o que, de forma infeliz, o próprio Pablo Aldrete fez. Por causa da presença de outros temas a tratar na película, ele não descarregara seu foco somente em um, mas sim em todos, convertendo-se em uma desordem completa. Para finalizar, entretanto, o diretor não perdeu o brilhantismo de sua abertura: o índio solta um grito de inexistência, do alto de um morro, na solidão abaixo. É como se sussurrasse: as terras são, verdadeiramente, de quem as protege? 

MINHA NOTA: 
POR BRUNO BARRENHA. 

2 comentários:

  1. Sempre me perguntei por que o western não vingou no Brasil. Temos tanto material e tanto talento aqui para produzir boas histórias. O sertão e seus retirantes, jagunços, coronéis e cangaceiros rendeu muitas histórias na Literatura e até alguns nordesterns, mas parou nisso.
    Hoje quando temos um cenário aparentemente melhor para produzir algo que dialogue com a nossa realidade (questão agrária, questão indígena, mortes encomendadas, prostituição, etc.) e com os elementos essenciais dos faroestes não se vê quase nada parecido. Vi aqui no blog pelo menos dois filmes, Rio de Ouro e Estrada de Palha, que sinalizam nessa direção. São obras um tanto tímidas, mas que ainda assim prestam uma homenagem a esse gênero e tentam dar a ele um pouco da cara de seu país (agora se conseguiram ou não é outra história). Me incomodo um pouco com a indiferença do Brasil em relação a criar um western nosso.

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  2. Vinicius,

    Acho que nos conhecemos do Mania ou de outro blog, já que faço comentários em vários.

    Não sei se vou entrar na sua linguagem, pois talvez eu não tenha entendido direito sua decepção. Mas, acontece que foram sim, feitos muitos e muitos filmes sobre o nosso sertão, sobre cangaceiros, coronéis e etc.

    Falo assim para o companheiro, que espero não se sinta magoado, porque eu mesmo vi mais de uma centena destes filmes, só que nas décadas de 60 e 70 onde, creio, o amigo ainda não vivia ou, se já vivia, ainda não frequentava as salas de cinema em função da idade.

    Tenho 68 e eu tenho também queixas como as suas pois, conforme podes observar em meus comentários anteriores, reclamo muito da falta de divulgação destas fitas, principalmente no Canal Brasil, que prima por tudo que é de nosso cinema.

    Grande abraço

    jurandir_lima@bol.com.br

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